A TEMÁTICA CRISTÃ NAS OBRAS DOS ARTISTAS DA SEMANA DE 22

01/06/2022
Capela da Nona /Candido Portinari – Museu de Arte Sacra
Capela da Nona /Candido Portinari – Museu de Arte Sacra

Há 100 anos, acontecia em São Paulo a Semana de Arte Moderna, manifestação artístico-cultural que teve como palco o Teatro Municipal. Realizada entre os dias 13 e 17 de fevereiro, a Semana de 22, como também é conhecida, foi um divisor de águas na cultura brasileira.

Inspirados nas vanguardas europeias, os artistas envolvidos no movimento se uniram para expor suas produções ao grande público. Foram apresentações de dança, música, recital de poesias, palestras e exposição com cerca de 100 obras, pinturas e esculturas.

Na primeira fase do Modernismo brasileiro, que corresponde de 1922 a 1930, os principais nomes são Anita Malfatti, Candido Portinari, Di Cavalcanti, Mário de Andrade, Heitor Villa-Lobos, Menotti Del Picchia, Victor Brecheret, Oswald de Andrade e Tarsila do Amaral.

Destacamos, a seguir, a arte religiosa de alguns de alguns desses modernistas de 22 e de sucessores do movimento.

Anita Malfatti (1889-1964) - Pintora e desenhista paulista, Anita Catarina Malfatti é uma das mais relevantes artistas brasileiras, fundamental na introdução do modernismo no País. Para alguns estudiosos, ela é a "mãe do Modernismo brasileiro".

"A Ressurreição de Lázaro", de 1928, é uma das obras sacras de grande destaque da pintora. A tela, que pertence ao MAS, tem como referência um dos milagres de Jesus, relatado no Evangelho segundo João 11,1-46.

Com mais de dois metros de altura, a obra foi realizada para o Pensionato Artístico do Estado de São Paulo, que possibilitou os estudos da artista plástica na Europa entre 1923 e 1928.

Victor Brecheret (1894-1955) - Escultor ítalo-brasileiro, Victor Brecheret, nascido Vittorio Brecheret, chegou a São Paulo aos 06 anos de idade. É um dos precursores do Modernismo na escultura brasileira. Muitas de suas obras estão expostas em locais públicos, principalmente, na capital paulista, como o "Monumento às Bandeiras" localizado no Parque do Ibirapuera.

No segmento sacro, destaca-se a "Via Crucis", de 1946. A obra, que conta a história da crucificação de Cristo, é um conjunto de 14 estações em terracota, esculpida para a capela do Hospital das Clínicas. Atualmente podemos ver esta obra no MAS.

Candido Portinari (1903-1962) - Nascido em Brodowski, interior de São Paulo, o pintor Candido Portinari é um dos principais nomes do Modernismo brasileiro. Ele se tornou conhecido por mudar de técnica ao longo dos anos, mas manter a temática de retratar o homem brasileiro e as questões sociais e históricas do País.

Mesmo sendo ateu, Portinari produziu cenas religiosas em larga escala. "Portinari é tributário da geração e do pensamento de época [da Semana de 22]. Dizem que ele é o artista ateu mais católico que existe".

O maior acervo sacro de Portinari, entre pinturas e afrescos, está exposto no Santuário Bom Jesus da Cana Verde, no centro da cidade de Batatais (SP), onde, inclusive, ele foi batizado. São painéis do início da década de 1950 que retratam a via-sacra e cenas da vida de Jesus. O destaque é o altar-mor que Portinari pintou com o Senhor Bom Jesus da Cana Verde.

Em 1941, Portinari fez pinturas murais em têmpera nas paredes da "Capela da Nonna", que ele mandou construir para sua avó, que estava doente, poder rezar.

São também destaques as obras de Portinari encontradas na região de Pampulha, em Belo Horizonte (MG), como a "Via Sacra", formada por 14 painéis, na Igreja de São Francisco de Assis, juntamente com um painel de São Francisco, em azulejaria pintada. A Igreja da Pampulha, como é conhecida, foi projetada por Oscar Niemeyer em 1943 e, na época, gerou polêmica devido ao modernismo empregado. Os jardins são de autoria do paisagista Burle Marx.

Alfredo Volpi (1896-1988) - O pintor italiano Alfredo Volpi chegou a São Paulo com apenas 01 ano de idade. É considerado pela crítica como um dos artistas mais importantes da segunda fase do Modernismo no Brasil, que se estendeu de 1930 a 1945.

Volpi é famoso pela série de bandeirinhas de festa junina, mas também se destaca por suas paisagens, temas populares e religiosos.

Os grandes murais pintados, no início da década de 1950, na Capela Cristo Operário, no bairro Alto do Ipiranga, em São Paulo, é um dos grupos mais significativos de sua obra na temática cristã.

"A pintura mural do Cristo Operário, de braços abertos, fica no altar-mor da igreja". "Do lado direito, está à representação da Sagrada Família; e, do lado esquerdo, Santo Antônio pregando aos peixes. É a coisa mais encantadora do mundo esse conjunto."

Aldo Bonadei (1906-1974) - Pintor e designer paulista, Aldo Bonadei, autodidata nas Artes, foi influenciado pela Semana de 22 e participou do Grupo Santa Helena.

Na temática sacra, se sobressai a pintura de "Santo Onofre", de 1933. A pesquisadora Karin conta que após a morte do artista, sua irmã, Inês Bonadei, doou, em 1975, o quadro ao Museu de Arte Sacra de São Paulo.

Cláudio Pastro (1948-2016) - Nascido na cidade de São Paulo, Cláudio Pastro é o artista sacro brasileiro contemporâneo de maior referência e um dos mais respeitados no mundo.

Dedicado à arte sacra desde 1975, Cristo Pantocrator é o principal tema e marca do seu trabalho. Pastro utilizou diferentes técnicas - pinturas, vitrais, azulejos, metais e esculturas - para produzir mais de 350 obras no Brasil e no exterior, como na Argentina, Bélgica, Alemanha, Espanha, entre outros países.

"Pastro é um artista sacro que se influenciou por diferentes artistas da Semana de 22. A maior referência dele é Victor Brecheret", diz a professora Wilma Steagall De Tommaso, doutora em Ciências da Religião.

Wilma, afirma que a obra de Pastro reflete a renovação religiosa e litúrgica do Concílio Vaticano II.

"O Concílio Vaticano II tem duas propostas fundantes. O Ad fonts, que é 'vamos ver como faziam e viviam os primeiros cristãos' e 'vamos fazer um aggiornamento' (atualização)", explica Wilma, acrescentando que "a Igreja nunca é nostálgica, ela vai pra frente".

A professora sinaliza que Pastro foi pioneiro no Brasil desse movimento em que a arte sacra é produzida em concordância ao Concílio. "Ele recriou o Cristo glorioso com uma nova linguagem no contexto latino-americano. Seus Pantocrators, por seus traços simples, sutis e elegantes, são facilmente reconhecidos". Na trajetória artística, o trabalho de maior destaque é a obra, iniciada na década de 1990, no Santuário Nacional de Aparecida, com a criação de painéis e vitrais e a concepção do espaço litúrgico.

Fonte: osaopaulo.org.br